"'Abertura para deus' e 'brecha' para o demônio: a 'libertação' entre católicos na cidade de São Paulo"
Esta tese, que provém de pesquisa etnográfica realizada entre os anos de 2013 e 2016 com um coletivo de cristãos que se concentram em um grupo de oração e uma comunidade católica na cidade de São Paulo/SP, tem como eixo o tema da libertação. O problema a que a tese se dedica é descrever um modo de existência no qual libertar não é se afastar, se separar, se emancipar, mas se vincular, se aproximar e se comprometer cada vez mais fortemente com deus. Com base nas experiências desses católicos, proponho que a libertação não é um evento, mas a manutenção da caminhada com deus. Em suma, trata-se de um percurso que não visa à liberdade e à autonomia do indivíduo, mas sim à aliança com a divindade. Esta incita a violência do demônio, que busca abrir uma brecha na abertura para deus que é própria da libertação. A consideração do caráter comungatório da relação com a divindade e da oposição demoníaca a esse vínculo constitui o fio condutor da etnografia, que analisa suas reverberações nas seguintes instâncias: nos modos de falar; na filiação a deus e em suas consequências no parentesco humano; na cura de mal-estares variados; nos modos de se relacionar com outras pessoas por meio da caridade; e na inevitabilidade da proliferação de intenções desconhecidas nos objetos que fazem parte do dia-a-dia. Todas elas me levam a postular que a onipresença de deus (que está em tudo) e a quase onipresença do demônio (que pode estar em tudo) só são possíveis em um mundo cuja qualidade fundamental consiste em ser aberto.