Indo para o jogo: políticas de mobilidade urbana em cidades-sede da Copa 2014 – Brasília e São Paulo
Passada a Copa do Mundo de 2014, a promessa de oportunidade de investimento em políticas de mobilidade para a população pode ser analisada sem o efeito discursivo do “legado” prometido pelos governos federal e estaduais no período anterior ao campeonato. Dentro da dinâmica da economia urbana, o estímulo a setores específicos, de forma fragmentada, tomou o espaço do debate sobre o futuro das cidades. Simultaneamente à execução das obras de mobilidade da Copa do Mundo, a política econômica de incentivo à indústria automobilística evidenciou a inconsistente orientação da política de mobilidade urbana. O processo de urbanização contemporâneo, dado de maneira fragmentada e em escala muito maior, contribui para entender porque a Política Nacional da Mobilidade Urbana, aprovada pelo Congresso Nacional nesse período (2012) após longa tramitação, não conseguiu ainda ter efeitos relevantes na orientação dos investimentos. Embora tenha ocorrido um considerável avanço no discurso sobre “mobilidade sustentável”, este não foi acompanhado de medidas econômicas que o sustentasse. Numa aliança entre indústria automotiva, empreiteiras e imobiliárias, o contexto da financeirização imobiliária se constituiu em um cenário de supressão de direitos de camadas populares, intensificado pelos megaeventos sediados em 12 capitais brasileiras. A transformação do espaço das cidades num dos grandes ativos da economia brasileira passou pelos setores automobilísticos, grandes empreiteiras e setor imobiliário, através do estímulo ao crescimento da frota de carros com IPI Zero, do Programa Minha Casa Minha Vida, grandes obras e a financeirização associada à especulação imobiliária em volta dos empreendimentos relacionados aos megaeventos e da construção dos grandes projetos de infraestrutura no país. Setores da economia se organizaram em coalizões urbanas, fundamentados no controle sobre o espaço urbano, na desapropriação, na ênfase ao transporte individual e na realocação de populações e atividades. Como pano de fundo tem-se a questão sobre como o poder público enfrenta o dilema entre a cultura do automóvel fomentada pelos próprios governos e a consciência crescente de que esse modelo torna a vida urbana inviável. Esta pesquisa se desenvolveu com a análise de duas cidades-sede da Copa do Mundo socioeconomicamente consideradas integrantes do Centro-Sul do país: Brasília (DF) e São Paulo (SP). Foram observados os fatores definidores dos modelos de mobilidade urbana em cada uma das cidades em questão: os meios de locomoção priorizados, rubricas definidas para gasto dos recursos, modelo de financiamento, concentração espacial dos investimentos, possibilidades de integração modal, concessões feitas e acessibilidade de tarifas, dentre outros. Foi analisado em que medida a recepção de um megaevento esportivo impactou as políticas urbanas de uma região. O estudo foi apoiado ainda na análise dos documentos oficiais produzidos no período: projetos de empreendimentos, relatórios de prestação de contas e estudos técnicos, além de entrevistas com atores-chave e relatórios produzidos pela sociedade civil enquanto mecanismos de controle social.