Dispositivo de violência letal: práticas e regulação da letalidade pela polícia e pelo Primeiro Comando Da Capital (PCC) em São Paulo
A transição democrática no final da década de 1980 e a emergência proeminente do Primeiro Comando da Capital (PCC), criado dentro do sistema penitenciário paulista no início década de 1990, demandaram reformulações no conjunto de questões sociológicas sobre segurança pública e violência. Neste sentido, a presente dissertação tem como propósito destacar o problema da violência letal praticada pelo PCC e pela Polícia, analisando suas características particulares e os pontos de interconexão entre as práticas legais e ilegais que protagonizam seus representantes na determinação da letalidade em São Paulo. A pesquisa buscou qualificar a organização da ação letal pelos irmãos do PCC sob a ótica de sua posição na resolução de conflitos interpessoais nas prisões e em algumas regiões territorializadas em São Paulo. A organização é identificada por ter reconfigurado o mundo do crime unindo operadores de práticas ilegais (tráfico de drogas, roubo etc.) em prol de ideias de progresso individual e luta coletiva contra o sistema. Paradoxalmente, o combate ao “crime organizado” é uma das justificativas mais recorrentes ao discurso de maior repressão (violenta), que reiteram a regularidade das ações letais por agentes das forças da ordem estatal. Os problemas relacionados à letalidade policial demonstram que as condições e as consequências do exercício do monopólio legal do uso da força no Brasil em geral, são decisivos às discussões sobre a ocorrência e o controle de crimes violentos letais. A partir de fontes secundárias e das teorizações de Michel Foucault sobre a tríade poder-saber-sujeito, essa pesquisa visa contribuir ao debate acadêmico e ao debate público sobre o excruciante e lancinante problema da letalidade violenta no Brasil. Cumpre responder à questão sobre a vigência de um dispositivo de produção da violência letal e organização da letalidade por meio do PCC e da Polícia, numa dinâmica social marcada pela destacada organização de uma moral criminal, e por uma prática policial que reproduz cada vez mais uma perspectiva violenta de combate ao crime.