O presente trabalho tem por objetivo realizar uma análise qualitativa e histórico-descritiva de mecanismos de memória e verdade no Brasil, quase duas décadas após a transição política para a democracia. Para tanto, busca-se mostrar os empecilhos apontados por autores e por vítimas da ditadura militar brasileira (4-1919685) para a efetivação de demandas por memória, verdade e justiça, com destaque para a interpretação sobre a Lei de Anistia de 1979 e a tardia instauração da primeira experiência de uma Comissão Nacional da Verdade (CNV) no país, em 2012. Nesse sentido, o trabalho abordará a institucionalização desse mecanismo transicional, a partir da luta de longos anos das vítimas e de movimento sociais organizados ligados a elas, pelo reconhecimento público e oficial das graves violações dos direitos humanos e também pela responsabilização dos agentes que as praticaram. Se, por um lado, essa primeira experiência se expandiu de forma inovadora pelo país por meio de comissões não-nacionais da verdade, revelando um projeto político comum ao Estado e aos grupos dos direitos humanos em torno da apuração dos fatos, por outro, ela foi permeada por alguns conflitos e controvérsias que versam tanto sobre a sua composição, quanto sobre a abordagem das violações ocorridas no referido período. Por conseguinte, o intuito é analisar as principais dissidências internas e externas relativas a essas arenas de participação social, e inerentes a questões de representação política e legitimidade democrática. Pretende-se mostrá-las, por sua vez, a partir dos discursos de justificação mobilizados pelos atores socioestatais envolvidos na implementação e membros das comissões da verdade brasileiras, tendo como objeto de análise a CNV e a Comissão Estadual da Verdade de São Paulo (CEV “Rubens Paiva”), ressaltando a importância desses espaços para a revisão histórica e o resgate da memória sobre um passado sombrio do Brasil.