Espaço, História e Tradição: o compound africano e a construção de identidade no Candomblé carioca

Tipo de Material
Outros
Autor Principal
Vianna, Hélio
Ano de Publicação
1996
Local da Publicação
Rio de Janeiro
Descrição Adicional
IV Seminário História da Cidade e do Urbanismo - PROURB/FAU/UFRJ
Idioma
Português
Resumo

Comentando uma disputa sucessória num conhecido Candomblé do Grande Rio, um notável pai-de-santo afirmou, rejeitando a legitimidade do principal candidato, que este deveria comprar um lote e começar a construir seu próprio terreiro. Num livro de autoria deste mesmo líder religioso, dá-se especial destaque à estrutura e organização das Casas: enterra os axés, plantar as árvores sagradas, construir os espaços públicos e os de uso restrito (Rocha, A.M. Os Candomblés Antigos do Rio de Janeiro. Topbooks, 1994, cap.2). Trago estes comentários como introdução porque eles demostram uma tendência a tornar natural algo que foi historicamente produzido: nem sempre possuir terras e construir edículas dedicadas aos deuses africanos, sustentados pelos devotos a eles consagrados (as irmandades de quarto), foi pré-requisito para a realização dos ritos do Candomblé. Acompanhemos este problema seguindo o fio da cronologia. As fontes mais antigas apontam para a existência de batuques na periferia das cidades, especialmente em Salvador e no Rio de Janeiro. Via de regra, as autoridades policiais nada encontravam que pudessem caracterizar como delito. O fato é que nesta época, os principais líderes religiosos residiam no centro da cidade, deslocando-se, quando necessário, para locais periféricos onde realizavam suas festas de maiores proporções. Como especialistas intinerantes estes sacerdotes associavam-se, se necessário, para atuar em barracões de madeira cobertos de material vegetal (V. Pierson, D. Brancos e Pretos na Bahia, Ed. Nacional, 1971 [1973], p. 323, com foto). Sua parafernália sagrada, no entanto, permanecia nas residências urbanas, onde atendiam sua clientela (João do Rio, As Religiões no Rio, Nova Aguilar, 1976, p.19). Com a Abolição e a progressiva fixação de famílias de antigos escravos rurais nas cidades, podemos perceber, entre 1890 e 1930, uma mudança na situação: festas e obrigações passam a se realizar nas moradias urbanas, casas antigas em bairros populares e centrais, fartamente documentadas, no caso do Rio de Janeiro, por cronistas da cidade, como João do Rio e Luís Edmundo. Mas estes mesmos escritores nos ensinam como o culto se estendia para fora dos limites das residências, espandindo-se para áreas públicas: praias, jardins, pedras, encruzilhadas, reputadas como fortes, árvores que supostamente abrigariam espíritos poderosos. Ao tempo das reformas no Rio de Janeiro, do Bota abaixo, d'O Rio Civiliza-se, ocorre uma notável ruptura: as intervenções urbanísticas restringiram o uso ritual dos locais públicos e derrubaram quarteirões inteiros do centro urbano, deslocando os especialistas religiosos e tornando mais visíveis aqueles que não haviam sido diretamente atingidos.

Disciplina
Referência Espacial
Cidade/Município
Rio de Janeiro
Brasil
Habilitado
UF
Rio de Janeiro