As mudanças econômicas, políticas e sociais ocorridas nas últimas décadas proporcionaram a ampliação da escolaridade feminina e o aumento progressivo da participação da mulher no mercado de trabalho. Hoje, aproximadamente 55% das brasileiras com 16 anos ou mais são economicamente ativas. Todavia, as mulheres continuam a ter um papel central no núcleo familiar, nos cuidados com os filhos e com toda a família, bem como no desempenho das atividades domésticas, independente do fato de exercerem um trabalho remunerado. Neste contexto, indaga-se sobre as possíveis associações entre a inserção no mercado de trabalho e as condições de saúde das mulheres. Revisões internacionais de estudos longitudinais que analisaram os efeitos do emprego sobre a saúde e o bem-estar feminino verificaram que, no geral, o trabalho remunerado não produz efeitos adversos para a saúde da mulher. Contudo, são poucos os estudos brasileiros dedicados a essa temática. Diante dessas considerações, o objetivo deste estudo foi analisar as condições de saúde, os comportamentos relacionados à saúde e a qualidade de vida relacionada à saúde de trabalhadoras remuneradas e de donas de casa, residentes na área urbana do município de Campinas, São Paulo. Foram utilizados dados do Inquérito domiciliar de Saúde do Município de Campinas (ISACamp 2008/2009), realizado pelo Centro Colaborador em Análise de Situação de Saúde (CCAS), da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Trata-se de um estudo transversal de base populacional, com amostra probabilística por conglomerados, tomada em dois estágios: setores censitários e domicílios. Os dados analisados foram de 668 mulheres de 18 a 64 anos de idade, residentes da área urbana do município de Campinas, e as análises foram realizadas no software Stata 11.0, com o comando svy, que considera os efeitos do delineamento complexo do processo amostral do inquérito. Os resultados desta tese são apresentados em três artigos. No primeiro estudo, "Diferenciais de saúde entre trabalhadoras remuneradas e donas de casa em um município brasileiro", foram avaliadas as diferenças em relação aos comportamentos relacionados à saúde e às condições de saúde entre trabalhadoras remuneradas e donas de casa. Foram feitos modelos de regressão múltipla de Poisson, com ajuste por idade, escolaridade, número de filhos, situação conjugal e renda familiar per capita, para estimar as razões de prevalências ajustadas. Foi possível observar diferenças em relação à saúde mental de mulheres, mas ausência de desigualdades nos comportamentos. As donas de casa apresentaram maior prevalência de queixas de problemas emocionais (ansiedade/tristeza) e de transtorno mental comum (avaliado pelo SRQ-20), que ficou no limiar da significância estatística, mas menor prevalência de asma/bronquite/enfisema e de relato de violência (limiar da signficância estatística). O segundo artigo, "Ser trabalhadora remunerada ou dona de casa associa-se à qualidade de vida relacionada à saúde (SF-36)?", avaliou a qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) e a inserção no mercado de trabalho, e se pertencer a determinado estrato socioeconômico modifica essa associação. A QVRS foi avaliada pelo instrumento The Medical Outcomes Study Instrument SF-36 ¿ Item Short Form Health Survey (SF-36). Foram feitos modelos de regressão linear simples e múltipla, com ajuste pela idade, escolaridade, renda familiar per capita, situação conjugal, número de filhos e número de doenças crônicas. Ser dona de casa associou-se com a pior QVRS, sobretudo com aspectos mentais, mas esta associação é modificada pelo nível socioeconômico. Nos segmentos de intermediária e baixa escolaridade e de renda familiar per capita as donas de casa apresentaram pior QVRS, mas não houve diferenças no alto estrato de escolaridade e de renda familiar. No terceiro artigo, "Saúde mental de mulheres adultas: estudo de base populacional no município de Campinas, São Paulo", analisou a associação dos transtornos mentais comuns (TMC) com a inserção no mercado de trabalho e com outras variáveis socioeconômicas e demográficas, de comportamentos e de saúde em mulheres adultas, por meio do Self Reporting Questionnaire 20 (SRQ-20). Foi criado um modelo hierárquico de regressão de Poisson em três etapas: variáveis socioeconômicas e demográficas, comportamentos e condições de saúde. As mulheres que eram donas de casa, aquelas com baixa escolaridade, sem companheiro e com três ou mais filhos apresentaram maior prevalência de TMC, bem como as mulheres com pior qualidade da dieta (não consumiam frutas, verduras ou legumes diariamente), que dormiam seis ou menos horas por noite, e relataram uma ou mais doenças crônicas, quatro ou mais problemas de saúde e que tinham sido vítimas de violência. Este estudo constatou que o trabalho remunerado esteve associado positivamente à saúde da mulher, principalmente, à saúde mental feminina. Contudo, não podemos desconsiderar o "efeito do trabalhador sadio": há maior probabilidade das mulheres saudáveis física e mentalmente estarem empregadas e se manterem trabalhando. Entretanto, a discussão dos presentes resultados com estudos longitudinais colabora para dar maior sustentação aos achados. As desigualdades na QVRS segundo inserção no mercado de trabalho, sobretudo quanto aos aspectos mentais, com prejuízos principalmente das donas de casa de pior nível socioeconômico, reforçam a necessidade de gerar mais oportunidades para a inserção da mulher no mercado de trabalho e acesso à educação. Ser dona de casa, ter baixa escolaridade, não ter companheiro e ter três ou mais filho, além de acumular doenças, ter comportamentos inadequados e ter sofrido violência foram fatores associados à presença de transtornos mentais comuns nas mulheres adultas. Portanto, espera-se que esses achados sobre as condições de saúde de trabalhadoras remuneradas e donas de casa possam colaborar no desenvolvimento de políticas públicas sociais e de saúde. Além de macro-políticas que ofereçam acesso à escolarização e condições para a inserção feminina no mercado de trabalho, como a criação de creches para que a mulher possa conciliar trabalho e família, é preciso capacitar os profissionais da atenção básica, como o médico da família, ginecologistas e demais profissionais da equipe de saúde na detecção e abordagem dos quadros de comprometimento da saúde mental feminina, sobretudo entre as mulheres donas de casa socialmente desfavorecidas.
Saúde e trabalho em mulheres adultas: estudo de base populacional no município de Campinas, São Paulo
Tipo de material
Tese Doutorado
Autor Principal
Senicato, Caroline
Sexo
Mulher
Orientador
Barros, Marilisa Berti de Azevedo
Ano de Publicação
2015
Programa
Saúde coletiva
Instituição
UNICAMP
Idioma
Português
Palavras chave
Saúde da mulher
Trabalho feminino
Qualidade de vida
Saúde mental
Inquéritos epidemiológicos
Resumo
Disciplina
Referência Espacial
Cidade/Município
Campinas
Macrorregião
Sudeste
Brasil
Habilitado
UF
São Paulo
Referência Temporal
2008-2009
Localização Eletrônica
http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/312915